.

.

domingo, 24 de novembro de 2013

Aspectos Processuais do Direito Ambiental

 

 

Introdução

O processo civil tradicional é, muitas vezes, incapaz de proteger de forma eficiente o meio ambiente, devido ao seu individualismo e morosidade. Uma ação, para ser efetiva, busca a entrega de uma prestação jurisdicional rápida e adequada ao interesse da demanda garantido pelo Estado. Com isso, necessário se faz a construção de um novo modelo de tutela processual capaz de amparar os novos direitos surgidos na modernidade, os direitos difusos, dentre os quais pode-se incluir o meio ambiente sadio. Este deve ser eficazmente resguardado, com a prevenção de atividades que causam sua degradação, por ser fundamental à vida.

Assim, uma das formas consagradas para proteger o meio ambiente é a tutela preventiva garantida no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal Brasileira de 1988. Objetiva-se estudar dentro do direito pátrio, através de princípios e regras do direito processual, uma forma dessa tutela, denominada pela doutrina de inibitória. A finalidade é contribuir com os ideais de que todos merecem uma sadia qualidade de vida, por meio da participação concreta da sociedade na preservação da natureza. O tema é relevante não apenas no âmbito jurídico, por dar maior credibilidade ao judiciário na prestação jurisdicional, como também no social, pois permite a participação de fato dos cidadãos na preservação do meio ambiente.

Os materiais utilizados nesta análise foram as anotações, e as discussões ocorridas em aula, assim como a doutrina e jurisprudência. Vale lembrar que o presente trabalho visa pontuar a matéria sem, entretanto se aprofundar em discussões doutrinárias existentes nos tópicos, conforme dispõe abaixo

Desenvolvimento

  1. Conceituação Jurídica

O meio ambiente como objeto de proteção jurídica, possui uma maior amplitude do que somente sua constituição por bens ambientais.

A legislação ambiental, representada pela Lei 6.938/81 – Politica Nacional de Meio Ambiente, traz o seguinte conceito jurídico:

Art.3° - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I – meio ambiente: o conjunto de condições, leis, influencias e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;...

Em face da sistematização dada pela Constituição de 1988, podemos afirmar que o conceito de meio ambiente dado pela Lei da Politica Nacional de Meio Ambiente foi recepcionado, pela Carta Magna de 1988, que buscou tutelar não só o meio ambiente natural, mas também o artificial, o cultural e o do trabalho[1].

a) Meio ambiente natural

Meio ambiente natural ou físico, é constituído por solo, água, ar atmosférico, flora e fauna. Concentra o fenômeno da homeostase, consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e o meio em que vivem.

Aludida conclusão é alcançada pela observação do artigo 225 da Lei Maior, que utiliza a expressão sadia qualidade de vida. De fato, o legislador constituinte optou por estabelecer dois objetos de tutela ambiental: “um imediato, que é a qualidade do meio ambiente, e outro mediato, que é a saúde, o bem estar e a segurança da população, que se vêm sintetizando na expressão da qualidade de vida [2]”.

O meio ambiente natural é mediatamente tutelado pelo caput do artigo 225 da Constituição Federal e imediatamente pelo §1°, I e VII desse mesmo artigo:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

2. Princípios estruturantes do direito ambiental aplicado a tutela judicial do meio ambiente.

O Direito ambiental passa a manter estrutura de ciência jurídica, como um:

“Complexo de princípios e normas coercitivas reguladoras das atividades humanas, que direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando á sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações” (MILARÉ, 2007,p.759).

Os grandes encontros mundiais, envolvendo a preocupação com a manutenção dos recursos ambientais do planeta, levaram a constituição de princípios, nos quais, são a base formadora de uma ciência e, no direito ambiental, são a base da própria norma.

Dentre os princípios constitutivos do Direito Ambiental, iremos abordar com maior ênfase neste trabalho, o principio da prevenção/precaução.

3. A preocupação do direito ambiental com o “risco” e com o “perigo”.

O Direito material ambiental fundamenta toda a atividade preventiva do meio ambiente principalmente em dois princípios: o principio da precaução e o principio da prevenção. Tais princípios enfocam idéia de risco e perigo.

O principio da precaução trabalha com os elementos risco e perigo. Tal princípio é voltado para a tutela do risco, buscando diminuí-lo ou rechaçá-lo, a fim de evitar-se a caracterização da situação de perigo.

É o entendimento de Christiane Derani [3]:

“O principio da precaução se resume na busca do afastamento, no tempo e no espaço, do perigo, na busca também da proteção contra o próprio risco e na analise do potencial danoso oriundo do conjunto de atividades publicas ambientais, onde a exigência de utilização da melhor tecnologia disponível é, tecnicamente, um corolário”.

A inserção deste princípio em nosso sistema adveio com a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992[4].

Este princípio rompe com o mito da certeza e da segurança jurídica. Representa o reconhecimento social mundial da imperatividade de uma tutela preventiva ambiental. Ilustra a mudança de paradigma da sociedade, reconhecendo o risco como realidade e abandonando o ideal iluminista da necessidade da certeza para garantir a segurança individual do cidadão, a fim de se resguardar a tutela de um interesse coletivo, transindividual, inerente a toda a sociedade.

O principio da precaução, na realidade, tem por função equacionar o problema temporal.

A precaução, nas precisas palavras de Lene Machado, “caracteriza-se pela ação antecipada diante do risco ou do perigo”.

O principio da prevenção aproxima-se do da precaução, mas com ele não se confunde.

Os princípios da prevenção e da precaução impõem a tutela do risco, em uma sociedade de risco, não há como se evitar todo e qualquer risco. O risco merece ser evitado é aquele que aponta para um perigo concreto de lesão ambiental. A lesão pode decorrer tanto de uma afronta á norma jurídica ambiental, ato ilícito, como da produção de um prejuízo concreto ao bem tutelado: dano.

O cerne da questão aqui, é determinar o grau de conveniência e tolerabilidade social dos riscos. E esta graduação de admissibilidade dos riscos é feita pela norma jurídica ambiental.

4. Principio da prevenção e da precaução

Há juristas que se referem ao principio da prevenção, enquanto outros reportam-se ao principio da precaução. Há também os que usam ambas as expressões, supondo ou não diferença entre elas.

De maneira sintética poderemos dizer que a prevenção trata de riscos ou impactos já conhecidos pela ciência, ao passo que a precaução se destina a gerir riscos ou impactos desconhecidos. Em outros termos, enquanto a prevenção trabalha com o risco certo, a precaução vai alem e se preocupa com o risco incerto. Ou ainda, a prevenção se dá em relação ao perigo concreto, ao passo que a precaução envolve perigo abstrato.

Ambas, são basilares do direito ambiental, concernindo à prioridade que deve ser dada ás medidas que evitem o nascimento de agressões ao ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade.

5. Principio da prevenção

Trata-se de um dos princípios mais importantes que norteiam o direito ambiental.

De fato, a prevenção é preceito fundamental, uma vez que danos ambientais, na maioria das vezes, são irreversíveis e irreparáveis. Para tanto, basta pensar: como recuperar uma espécie extinta?Como erradicar os efeitos da Chernobyl? Ou, de que forma restituir uma floresta milenar que fora devastada e abrigava milhares de ecossistemas diferentes, cada um com o seu essencial papel na natureza?.

Diante da impotência do sistema jurídico, incapaz de restabelecer, em igualdades de condições, uma situação idêntica à anterior, adota-se o principio da prevenção do dano como sustentáculo do direito ambiental, consubstanciando-se como seu objetivo fundamental. [5]

A nossa Constituição Federal de 1988 expressamente adotou o principio da prevenção, ao preceituar, no caput do art. 225, o dever do Poder Público e da coletividade de proteger e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. [6]

A prevenção e a preservação devem ser concretizadas por meio de uma consciência ecológica, a qual deve ser desenvolvida através de uma politica de educação ambiental[7].

Além disso, a efetiva prevenção do dano deve-se também ao papel exercido pelo Estado na punição correta do poluidor, pois, dessa forma, ela passa a ser um estimulante negativo contra a prática de agressões ao meio ambiente.

Uma legislação severa que imponha multas e sanções mais pesadas funciona também como instrumento de efetivação de prevenção. Para tanto, é imprescindível que se leve em conta o poder econômico do poluidor, de modo a não desvirtuar o principio através de um simples cálculo aritmético[8].

Aplica-se esse principio, quando o perigo é certo e quando se tem elementos seguros para afirmar que uma determinada atividade é efetivamente perigosa.

Na prática, o principio da prevenção tem como objetivo impedir a ocorrência de danos ao meio ambiente, através da imposição de medidas cautelatórias antes da implantação de empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras.

6. Principio da precaução

A invocação do principio da precaução é uma decisão a ser tomada quando a informação cientifica é insuficiente, inconclusiva ou incerta e haja indicações de que os possíveis efeitos sobre o ambiente, a saúde das pessoas ou dos animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e incompatíveis com o nível de proteção escolhido.

É pacífico entre os doutrinadores que o princípio da precaução se constitui no principal orientador das políticas ambientais, além de ser a base para a estruturação do direito ambiental. Nesse sentido, diante da crise ambiental que relega o desenvolvimento econômico sustentável em segundo plano a da devastação do meio ambiente em escala assustadora, prevenir a degradação do meio ambiente passou a ser preocupação constante de todos aqueles que buscam melhor qualidade de vida para as presentes e futuras gerações.

Em que pese a recente preocupação no país com a aplicação do princípio da precaução, pode-se dizer que a Alemanha aborda o referido princípio desde 1970, na Declaração de Wingspread, juntamente com o princípio da cooperação e do poluidor-pagador.

Assim, o doutrinador alemão Kloespfer afirma que:

"a política ambiental não se esgota na defesa contra ameaçadores perigos e na correção de danos existentes. Uma política ambiental preventiva reclama que as bases naturais sejam protegidas e utilizadas com cuidado, parciosamente." (apud DERANI, 1997, p. 165).

A Declaração de Wingspread aborda o Princípio da Precaução da seguinte maneira: "Quando uma atividade representa ameaças de danos ao meio ambiente ou à saúde humana, medidas de precaução devem ser tomadas, mesmo se algumas relações de causa e efeito não forem plenamente estabelecidos cientificamente[9]”.

No direito positivo brasileiro, o princípio da precaução tem seu fundamento na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938, de 31/08/1981), mais precisamente no artigo 4, I e IV, da referida lei, que expressa a necessidade de haver um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a utilização, de forma racional, dos recursos naturais, inserindo também a avaliação do impacto ambiental.

Salienta-se, que o referido princípio foi expressamente incorporado em nosso ordenamento jurídico, no artigo 225, § 1o, V, da Constituição Federal, e também através da Lei de Crimes Ambientais (lei 9.605/1998, art. 54, § 3o).

O artigo 225, § 1o, inciso IV da Constituição Federal expressa que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1o – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

IV – Exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio do impacto ambiental.

Convém, a título de esclarecimento do conceito do princípio da precaução, citar Derani:

Precaução é cuidado. O princípio da precaução está ligado aos conceitos de afastamento de perigo e segurança das gerações futuras, como também de sustentabilidade ambiental das atividades humanas. Este princípio é a tradução da busca da proteção da existência humana, seja pela proteção de seu ambiente como pelo asseguramento da integridade da vida humana. A partir desta premissa, deve-se também considerar não só o risco eminente de uma determinada atividade, como também os riscos futuros decorrentes de empreendimentos humanos, os quais nossa compreensão e o atual estágio de desenvolvimento da ciência jamais conseguem captar em toda densidade [...][10].

Dessa forma, o princípio da precaução implica uma ação antecipatória à ocorrência do dano ambiental, o que garante a plena eficácia das medidas ambientais selecionadas. Neste sentido, Milaré assevera que "Precaução é substantivo do verbo precaver-se (do latim prae = antes e cavere = tomar cuidado), e sugere cuidados antecipados, cautela para que uma atitude ou ação não venha resultar em efeitos indesejáveis.[11]”.

Observe-se que a consagração do princípio da precaução no ordenamento jurídico pátrio representa a adoção de uma nova postura em relação à degradação do meio ambiente. Ou seja, a precaução exige que sejam tomadas, por parte do Estado como também por parte da sociedade em geral, medidas ambientais que, num primeiro momento, impeçam o início da ocorrência de atividades potencialmente e/ou lesivas ao meio ambiente. Mas a precaução também atua, quando o dano ambiental já está concretizado, desenvolvendo ações que façam cessar esse dano ou pelo menos minimizar seus efeitos.

Nesta linha de pensamento, Machado nos ensina que:

A precaução age no presente para não se ter que chorar e lastimar o futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o prejuízo ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões humanas, como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. Evita-se o dano ambiental através da prevenção no tempo certo[12].

Por tudo isso, afirma-se que o princípio da precaução é a base das leis e das práticas relacionadas à preservação do meio ambiente. É preciso, antes de tudo, se antecipar e prevenir a provável e/ou efetiva ocorrência de uma atividade lesiva, pois há de se considerar que nem todos os danos ambientais podem ser reparados pela ação humana. Hoppe assevera que "é uma precaução contra o risco, que objetiva prevenir já uma suspeição de perigo ou garantir uma suficiente margem de segurança da linha de perigo[13]."

Desse modo, a atuação do princípio da precaução não se constitui apenas num recurso contra a degradação do meio ambiente. Pelo contrário, sua significação compreende também a garantia da preservação da espécie humana e, conseqüentemente, uma melhor qualidade de vida para a coletividade.

Anote-se, que a omissão na adoção de medidas de precaução, em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível, foi considerada pela Lei 9.605/1988 (Lei dos Crimes Ambientais) como circunstancia capaz de sujeitar o infrator a reprimenda mais severa, idêntica à do crime de poluição qualificado pelo resultado (art.54,§3°). Por igual, a Lei 11.105/2005 (Lei da Biossegurança) também fez menção expressa ao principio em suas exposições preliminares e gerais, ao mencionar como diretrizes “o estimulo ao avanço cientifico na área de Biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e a saúde humana, animal, vegetal, e a observância do principio da precaução para a proteção do meio ambiente” (art.1°, caput).

7. A tutela inibitória como tutela da norma jurídica ambiental

O ordenamento jurídico ambiental confere à norma a força de efetivamente regular as condutas sociais, a fim de assegurar o caráter inviolável do bem jurídico ambiental.

A norma jurídica ambiental pode assumir a roupagem de principio ou de regras, mas em qualquer uma de suas manifestações, sua natureza inviolável é marca característica.

A tutela inibitória consiste em modalidade de prestação jurisdicional destinada a proteger a integridade da norma, ou seja, trata-se de tutela que antes de preocupar-se com o dano, destina-se ao ilícito.

O ilícito consiste no ato de violação de uma norma. Como bem define Vittorino Pietrobon [14] (...). O autor ainda ressalta que a norma de conduta violada deve derivar necessariamente da lei, uma vez que, se tratar de uma obrigação convencional, configura-se o inadimplemento e não o ilícito.

A ação inibitória, destina-se ao ilícito, visa proteger a inviolabilidade da norma. A ação inibitória prescinde da análise do dano, da culpa e do dolo.

A tutela contra o ilícito é independente da tutela contra o dano. Para prevenir – se o ilícito não é necessário verificar o evento danoso. Como a culpa e o dolo consistem em categorias próprias da tutela repressiva do dano, sua investigação também se torna desnecessária.

A tutela inibitória pode ser antecedente a qualquer ilícito, caso em que o ilícito ainda não ocorreu, ou pode ter por fim evitar sua continuação ou repetição.

Uma vez que a Constituição Federal garante o meio ambiente ecologicamente equilibrado, poder-se ia perguntar se seria possível conceber que qualquer afronta a esta clausula geral de inviolabilidade configuraria um ilícito ambiental, ainda que não tipicamente previsto, hábil a justificar a necessidade de uma tutela inibitória.

Se por um lado, existe uma necessidade de se proteger o meio ambiente, de outro é importante garantir o desenvolvimento e a atividade econômica. É por isso que há riscos que devem ser evitados, assim como há aqueles que devem ser suportados, e é a norma que estabelece o grau de tolerabilidade do risco.

O objetivo da tutela inibitória é impedir que tal atividade seja realizada em desacordo com a lei, porque neste caso, sim, a atividade estaria gerando um risco que o legislador presumiu inadmissível.

A tutela inibitória, como mecanismo destinado a violação da lei, deve sempre ter um fundamento normativo, ou seja, o pedido de tutela deve estar sustentado na ameaça de violação de um dever legal expressamente descrito.

8. Tutela de prevenção do ilícito e a tutela de prevenção do dano.

Esta distinção, é pouco trabalhada pelos estudiosos do direito ambiental, porque na maioria dos casos, ilícito e dano concretizam-se no mesmo instante.

Se o risco for socialmente admissível, o legislador presumiu-o suportável e considerou a atividade que o gera como ilícita. Em contrapartida, se o risco foi tido como inadmissível, o legislador considerou a conduta que o provoca como ilícita. Portanto, diante da iminência da pratica de uma conduta que produza um risco inadmissível – ilícito -, configura-se o perigo de ilícito.

Vale ressaltar que só é possível tutelar o dano quando este configura também um ilícito. Isto porque se a atividade era permitida, ou seja, se a conduta que gera perigo de dano não configurou um ilícito, trata-se de um risco que o legislador considerou tolerável.

A atuação do Poder Público deve ser pautada em lei, se aquele autoriza uma atividade danosa ao meio ambiente, violou a norma, e, portanto, este ato autorizativo consiste em ato ilícito, e a atividade decorrente deste ato ilícito também é ilícita: ambas são passiveis de responsabilização. Tanto é assim que o artigo 9°,IV da Lei de Politica Nacional do Meio Ambiente, Lei 6.938/81, prevê a possibilidade de revisão do licenciamento.

Como o licenciamento indevido consiste em ato ilícito, e este já ocorreu, contra tal ato cabe tanto uma tutela de prevenção do dano como uma tutela de remoção do ilícito.

Diante a uma ameaça de afronta a um bem jurídico ambiental, é necessário primeiro verificar se o ilícito e o dano ocorrem no mesmo instante ou em momentos temporais diversos.

Mas, se o dano e o ilícito configuram-se no mesmo instante, cabe tanto uma tutela contra o ilícito, como uma tutela contra o dano.

Isto prova que a ameaça de dano se dá mediante atos concretos, e, se o autor dispõe de um dado objetivo que demonstre a lesão ao meio ambiente, sua prova será facilmente realizada. Nos demais caos, que não existe um elemento objetivo para comprovar o dano, o que ocorre com mais freqüência, a ação de prevenção do ilícito, certamente será mais conveniente.

O objeto a ser provado é muito mais restrito, uma vez que aqui não se exige a demonstração do perigo de dano, muito menos da culpa e do dolo. Para a concessão de uma tutela contra o ilícito, basta que reste demonstrada a violação de uma norma.

A tutela inibitória é um instrumento utilizado tanto para a tutela de violação da norma como para a tutela para evitar o dano, uma vez que, ao se prevenir o ilícito, inevitavelmente previne-se o dano.

9. A atuação da tutela inibitória ambiental

A tutela inibitória ambiental tem como fundamento legal o artigo 5°,XXXV da Constituição Federal, bem como o artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor, conforme dispõem:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

§ 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da multa (art. 287, do Código de Processo Civil).

§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

É o entendimento jurisprudencial:

O provimento do juiz na tutela das obrigações de fazer ou não fazer não se restringe a mera condenação, mas abrange expedição de mandamentos e ordens (ação mandamental) que, se descumpridas, configuram crime de desobediência como ato de afronta a justiça e não apenas a parte contraria (TJRJ, AI 98.002.02138, rela. Desa. Maria Henriqueta Lobo, j. 22.6.98)[15].

No caso de ameaça de violação de uma norma ambiental, é permitido ao autor postular em juízo à intervenção do Poder Público em momento anterior a superveniência do ilícito, mediante a imposição de uma ordem de um fazer ou não fazer ao demandado, sob pena de multa.

A tutela inibitória vale-se da técnica mandamental, mediante a qual a decisão do juiz vem acompanhada de um elemento coercitivo, normalmente a multa. (...). Trata-se, na verdade, da utilização de um meio de coerção indireta, pois a ordem do juiz vem acompanhada de um ônus que o devedor deverá suportar caso não cumpra o fazer ou o não fazer determinado pelo juiz.

Para que a multa alcance seu objetivo, deve ser adequadamente mensurada, e o parâmetro a ser utilizado consiste no principio do poluidor pagador, eis que este também possui potencial preventivo.

Nada impede que o valor da multa seja aumentado ou diminuído se não estiver atingindo seu fim. Tanto a multa graduada em valor inferior à disposição a pagar do demandado como a que for aplicada em quantia demasiadamente alta não terão o condão de coagir e, portanto, não surtir o resultado desejado.

A inclusão do §6° da no artigo 461 do Código de Processo Civil, pela Lei 10.444/02 só vem ratificar o que antes já se vinha afirmando. Dispõe expressamente o §6°: “O juiz poderá, de oficio, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.”

10. A tutela inibitória antecipada

A tutela inibitória pode ser concedida tanto na forma antecipada, quanto na forma de tutela final.

Não se pode pensar em justiça ambiental que não atue antes da violação do direito. Há que se considerar que embora a tutela inibitória final (concedida na sentença) disponha de natureza preventiva, seja destinada a evitar a pratica do ilícito e tenha um tema probandum mais restrito, com intuito de proporcionar um provimento jurisdicional mais célere, pode ocorrer que a necessidade de proteção seja imediata e que não possa aguardar a concessão da tutela final.

Nestes casos, em que há lesão iminente, se o autor demonstrar os dois requisitos estabelecidos pela lei, a relevância do fundamento e o justificado receio de ineficácia do provimento final, o juiz poderá conceder a tutela de forma antecipada. Todavia, é importante deixar claro em que consistem tais requisitos.

A relevância do fundamento, o que alguns autores equiparam ao fumus boni iures, para a ação inibitória consiste na probabilidade de ilicitude. “Exige-se então, que o autor seja capaz de convencer o juiz, ainda que com elementos mínimos, ao reconhecimento 9ainda que sem força declarativa suficiente)da plausibilidade de existência do direito afirmado.

O justificado receio de ineficácia do provimento final, por sua vez, nada mais é do que o perigo de ilícito que o tempo do processo possa causar, ou seja, a impossibilidade de se aguardar a concessão do provimento final, sob pena de ver-se o ilícito caracterizado.

Por fim, a tutela inibitória antecipada é concedida com base em juízo de valor de aparência, o juiz terá de decidir com base na probabilidade da afirmação do direito. por esta razão compete ao juiz sopesar os valores em confronto e julgar aplicando o principio da proporcionalidade.

Considerações finais

Em prol da proteção do meio ambiente, consagrada no artigo 225 da Constituição Federal de 1988, discutiu-se uma forma de tutela capaz de garantir com maior eficácia a sua preservação. Essa, denominada pela doutrina de inibitória, é capaz de possibilitar não apenas a prevenção do dano, mas principalmente do ilícito, já que aquele é conseqüência eventual deste. Nesse ínterim, tutela inibitória é o fundamento da ação adequada a impedir a prática ou a continuação do ilícito, mediante um não fazer, ou dirigida, através de um fazer, a realizar o desejo preventivo da norma de proteção ambiental. Então, concluo que, com o advento do artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor, aquele que se beneficia de uma atividade que gera poluição não deve arcar somente com os prejuízos que podem ser a ele diretamente atribuídos. A sua responsabilidade vai alem, com a obrigação de fazer cessar a prática ou proporcionar meios de impedir a degradação do meio ambiente, como por exemplo a instalação de filtros nas chaminés das indústrias. O princípio da precaução passa a ser o mais importante no direito ambiental, uma vez que depois da destruição da natureza é praticamente impossível a sua recomposição ao estado anteriormente visto. E diante das agressões que estão sendo cometidas pelo homem contra o meio ambiente, conclamo todos, e, principalmente o Estado, a lutar por um mundo ecologicamente melhor, através da tutela de prevenção do ilícito, ou seja, a tutela inibitória.

Por fim, cumpriu o presente trabalho a função de elaborar uma análise acerca dos aspectos processuais do direito ambiental, com enfoque na tutela inibitória, tratando a matéria, sem com isso pontuar discussões doutrinárias e jurisprudenciais.

Referências bibliográficas

DA SILVA, Jose Afonso. Direito Constitucional ambiental. Malheiros: São Paulo, 1994.

DERANI, Christiane. Direito ambiental econômico. Max Limonad: São Paulo, 1997.

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. Saraiva: São Paulo, 2006.

MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros: São Paulo, 2001

LEITE, Morato José Rubens e outro. Aspectos processuais do direito ambiental. Forense: Rio de Janeiro, 2003

OLIVEIRA. James Eduardo. Código de defesa do consumidor. Anotado e comentado doutrina e jurisprudência


[1]. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. Saraiva: São Paulo, 2006. p. 19.

[2]. DA SILVA, Jose Afonso. Direito Constitucional ambiental. Malheiros:São Paulo, 1994.p.54.

[3]. DERANI, Christiane. Direito ambiental econômico. Max Limonad: São Paulo, 1997,p.38.

[4]. O principio da precaução vem ainda previsto em outras duas convenções internacionais. Na Convenção de Diversidade Biológica, promulgada pelo Decreto n° 2.519/1998. No mesmo sentido, orientou-se a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança de Clima.

[5]. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. Saraiva: São Paulo, 2006. p.39.

[6]. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. Saraiva: São Paulo, 2006. p. 40.

[7]. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 2006. p.40.

[8]. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 2006. p.40

[9]. PRINCÍPIO da precaução. Uma maneira sensata de proteger a saúde pública e o meio ambiente. Preparado por The Science and Enviromental Heath Network. Tradução de Lúcia A. Melin. Disponível em http://www.fgaia.org.br/texts/t-precau.htm.

[10]. DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. Max Limonad: São Paulo, 1997.p.167.

[11]. MIRRA, Álvaro. In: MORATO LEITE, José Rubens (Org.). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2000. p.62

[12]. MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros: São Paulo, 2001. p. 57.

[13]. DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. : Max Limonad: São Paulo, 1997.p. 165.

[14]. PIETROBON, Vittorino. Illecito e fatto illecito. Inibitória e risarcimento. Padova, Cedan, 1999,p.119. APUD. LEITE, Morato José Rubens e outro. Aspectos processuais do direito ambiental. Forense: Rio de Janeiro, 2003.p.132.

[15]. OLIVEIRA. James Eduardo. Código de defesa do consumidor. Anotado e comentado doutrina e jurisprudência. 4°ed. Atlas: São Paulo,2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário